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Nó Cego e Bengala de Cego

terça-feira, 17 de julho de 2012

O Caminho de Volta

 
 
 Já estou voltando. Só tenho 37 anos e já estou fazendo o caminho de volta.
 
 Até o ano passado eu ainda estava indo. Indo morar no apartamento mais
 alto do prédio mais alto do bairro mais nobre. Indo comprar o carro do
 ano, a bolsa de marca, a roupa da moda.
 
 Claro que para isso, durante o caminho de ida, eu fazia hora extra,
 fazia serão, fazia dos fins de semana eternas segundas-feiras.
 
 Até que um dia, meu filho quase chamou a babá de mãe!

 Mas, com quase 40 eu estava chegando lá.
 
 Onde mesmo?
 
 No que ninguém conseguiu responder, eu imaginei que quando chegasse lá
 ia ter uma placa com a palavra FIM. Antes dela, avistei a placa de
 RETORNO e nela mesmo dei meia volta.

 Comprei uma casa no campo (maneira chique de falar, mas ela é no meio
 do mato mesmo), É longe que só a gota serena. Longe do prédio mais
 alto, do bairro mais chique, do carro mais novo, da hora extra, da
 babá quase mãe.

 Agora tenho menos dinheiro e mais filho. Menos marca e mais tempo.
 
 E num é que meus pais (que quando eu morava no bairro nobre me
 visitaram 4 vezes em quatro anos) agora vêm pra cá todo fim de semana?
 E meu filho anda de bicicleta e eu rego as plantas e meu marido
 descobriu que gosta de cozinhar (principalmente quando os ingredientes
 vêm da horta que ele mesmo plantou).

 Por aqui, quando chove, a Internet não chega. Fico torcendo que chova,
 porque é quando meu filho, espontaneamente (por falta do que fazer
 mesmo) abre um livro e, pasmem, lê. E no que alguém diz “a internet
 voltou!” já é tarde demais porque o livro já está melhor que o
 Facebook, o Twitter e o Orkut juntos.

 Aqui se chama ALDEIA e tal qual uma aldeia indígena, vira e mexe eu
 faço a dança da chuva, o chá com a planta, a rede de cama.

 No São João, assamos milho na fogueira. Nos domingos converso com os
 vizinhos. Nas segundas vou trabalhar contando as horas para voltar.
 
 Aí eu lembro da placa RETORNO e acho que nela deveria ter um subtítulo
 que diz assim: RETORNO – ÚLTIMA CHANCE DE VOCÊ SALVAR SUA VIDA!

 Você provavelmente ainda está indo. Não é culpa sua. É culpa do
 comercial que disse: “Compre um e leve dois”.

 Nós, da banda de cá, esperamos sua visita. Porque sim, mais dia menos
 dia, você também vai querer fazer o caminho de volta.
 
 

Téta Barbosa




Téta Barbosa é jornalista, publicitária, mora no Recife.


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